Fisco pode pedir IVA de reabilitação em retroativo!

Um novo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) está a gerar polémica pois permite que as Finanças cobrem milhares de euros de IVA relativamente a obras de reabilitação urbana em retroativo, mesmo a contribuintes que tinham ganho processos contra o Fisco. Vejamos o que está em causa.

Jurisprudência do Supremo e as siglas ARU e ORU

Esta situação de cobrança em retroativo de IVA advém do facto deste acórdão do STA (nº 012/24.9BALSB) fixar jurisprudência, ou seja, na prática, impõe a sua decisão a sentenças e acórdãos de tribunais inferiores.
Ora, a grande conclusão deste acórdão consiste nos requisitos para poder aplicar a taxa reduzida de IVA nas obras de reabilitação urbana. Segundo o STA, não basta que a obra se situe numa ARU (Área de Reabilitação Urbana), sendo sempre necessário que tenha sido previamente aprovada no âmbito de uma ORU (Operação de Reabilitação Urbana).

Finanças podem chamar empresas a pagar a diferença do IVA

Assim, se as empresas aplicaram a taxa de 6% de IVA nestas obras, mesmo que até tenham ganho processos em tribunal contra as Finanças, com o novo acórdão do STA, poderão ser chamadas a pagar a diferença de 6% para 23%, dentro do prazo de caducidade de 4 anos. Trata-se de uma situação que cria instabilidade no setor.

Confusão do IVA da reabilitação dura há anos

Refira-se que a confusão com o regime de IVA na reabilitação dura há vários anos com decisões contraditórias em tribunal e mudanças na legislação. Conforme temos analisado na Revista Gerente, o entendimento inicial das Finanças era a necessidade de ambos os requisitos (ARU + ORU). Contudo, várias empresas tinham conseguido anular essa situação em tribunal devido a incongruências, como seja o facto do regime jurídico que estabelece a necessidade de ORU ser posterior à verba do código do IVA.

Mais recentemente, o Programa Mais Habitação veio alterar o Código do IVA, mudando a redação da verba, tendo as próprias Finanças admitido em Ofício Circulado (nº25003) que com as novas regras, a partir de 7/10/2023, as “operações agora abrangidas deixam de estar sujeitas à existência de uma “operação de reabilitação urbana”.
Mesmo assim, houve empresas que conseguiram aplicar as novas regras a obras realizadas antes de 7/10/2023, ganhando processos em tribunal.

Acórdão aplica-se apenas antes de 7/10/2023 ou também depois?

Assim, se as próprias Finanças consideram que a partir de 7/10/2023 já não é necessário o requisito de ORU, surge a dúvida a que obras se aplica o novo acórdão. Se só às obras antes dessa data ou também depois dessa altura?
Ora, apesar de ser um acórdão de fixação de jurisprudência, tudo indica que apenas se aplicará às situações até 6/10/2023.
Mesmo tendo em conta esta limitação, há uma instabilidade fiscal em que as regras mudam constantemente ao sabor dos tribunais. Uma empresa que tenha realizado uma obra de 1 milhão de euros pode ter de pagar 170 mil euros de IVA a mais (diferença entre 6% e 23%).